Foto: Joi (CC Flickr) |
O texto de Howard Rheingold, abaixo, pertence à obra Is the Internet Changing the Way You Think?: The Net's Impact on Our Minds and Future (2011).
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A mídia digital e as redes podem empoderar apenas as pessoas que aprendem como usá-las – e representam um perigo para aquelas que não sabem o que estão fazendo. Sim, é fácil encaminhar-se para a distração, cair em desinformação, prestar atenção ao fragmento em vez do que é central, porém essas tentações mentais representam riscos apenas para uma mente não treinada. Aprender a disciplina mental para usar as ferramentas de pensamento, sem perder o foco, é um dos preços que orgulhosamente pago para obter aquilo que a web tem a oferecer.Aquelas pessoas que não possuem literacias fundamentais como a atenção, a detecção de lixo, colaboração e consciência sobre a rede estão correndo riscos a respeito de todas as armadilhas apontadas – superficialidade, credulidade, distração e vício. Preocupo-me com os bilhões de pessoas que estão obtendo acesso à net sem a menor ideia de como encontrar conhecimento e verificar sua veracidade; como reivindicar e participar, mais do que consumir passivamente; como disciplinar e desenvolver atenção num ambiente sempre online; como e por que usar aquelas proteções de privacidade que continuam disponíveis num ambiente cada vez mais intrusivo.
As pessoas que não possuem literacias fundamentais, como a atenção, correm riscos
Tenho concluído que as situações de minha própria vida como escritor profissional – se as palavras não vêm, o dinheiro também não virá – conduziram-me a desenvolver um conjunto de métodos e disciplinas. Sei que outros têm dominado muito além de minha prática e hábitos mentais vacilantes, e suspeito que aprender essas habilidades é menos difícil que aprender divisão fracionada. Exorto os pesquisadores e educadores a olharem de forma mais sistemática o que estou apontando.Quando comecei como um escritor freelance na década de 1970, minhas ferramentas mais importantes eram um cartão de biblioteca, uma máquina de escrever, um bloco de notas e um telefone. Nos anos de 1980 interessei-me pelo pessoal do Centro de Pesquisa da Xerox de Palo Alto (PARC) que estava usando computadores para editar texto sem cortar, colar, fisicamente, e redatilografar as páginas.
Por meio do PARC, descobri Douglas Engelbart, que tinha gasto a primeira década de sua carreira tentando convencer alguém, qualquer um, que usar computadores para aumentar o intelecto humano não era uma ideia maluca. Engelbart tinha feito publicações, no início dos anos de 1960, demonstrando que os computadores poderiam ser usados para automatizar tarefas de apoio de baixo nível cognitivo, como cortar, colar, revisar texto e também permitir auxílios intelectuais, como o hiperlink, que não eram possíveis na era tecnológica de Gutenberg.
Ele estava convencido que este novo modo de usar os computadores poderia resultar num “aumento da capacidade de um homem lidar com uma situação-problema complexa, obtendo compreensão adequada de suas necessidades específicas, para obter soluções para o problema. Aumentar a capacidade, nesse sentido, significa a mistura do seguinte: compreensão mais rápida, melhor compreensão, a possibilidade de obter um nível útil de compreensão numa situação que era muito complexa previamente, soluções mais rápidas, melhores soluções e a possibilidade de descobrir soluções para problemas que antes pareciam insolúveis”. Não obstante ressalvas relevantes e efeitos colaterais imprevistos, as previsões de Engelbart concretizaram-se de modos que o surpreenderam. O que não o surpreendeu foi a importância tanto do know-how quanto do how-to-know que desbloquearam as oportunidades que as tecnologias de aumento cognitivo ofereceram.
Desde o inicio, Engelbart enfatizou que o hardware e o software criados no laboratório do Instituto de Pesquisa de Stanford, desde o mouse até o hyperlink e o processador de texto, eram parte de um sistema que incluía “humanos, linguagem, artefatos, metodologia e treinamento”. Muito antes da web aparecer, Engelbart sentia-se frustrado por haver muito progresso nas capacidades dos artefatos, mas pouca investigação dedicada a avanços na linguagem, metodologia e formação – as literacias que necessariamente acompanham as capacidades técnicas.
Compartilhar conhecimento e agir coletivamente envolve letramentos colaborativos
A atenção é o letramento fundamental. A cada minuto que eu gasto online, eu tomo decisões sobre a que dedicar minha atenção. O quanto devo fixar-me no todo de um comentário ou em seu título? Essa é uma questão que preciso responder toda vez que um link atrativo chama minha atenção. Apenas tornar-me consciente para o fato de que a vida online requer esse tipo de tomada de decisão foi meu primeiro passo para aprender a colocar um filtro básico no que terei na cabeça – um filtro que está sob meu controle apenas se eu praticar seu uso. O segundo nível de tomada de decisão é se quero abrir uma aba no meu navegador, pois decidi que esse item valerá ser visto amanhã. A terceira decisão: favoritar esse site, porque estou interessado no assunto e talvez deseje fazer referência a ele em alguma ocasião no futuro? A domesticação da atenção online começa com o que os que praticam meditação chamam de “atenção total” – a simples autoinfluência na consciência de como a atenção vagueia.A vida online não é solitária. Ela é social. Quando eu marco e favorito um website, um vídeo, uma imagem, eu torno minhas decisões visíveis a outros. Eu tomo vantagem do conhecimento curatorial feito pelos outros quanto começo a aprender um tópico, explorando favoritos, encontrando uma imagem para comunicar uma ideia pela busca de uma tag. Compartilhar conhecimento e agir coletivamente envolve letramentos colaborativos.
A detecção de lixo – nome de Hemingway para o que os bibliotecários digitais chamam de avaliação de credibilidade – é outro letramento essencial. Se todos os estudantes tivessem que aprender uma habilidade antes de ir para o mundo online pela primeira vez, acredito que deveria ser a habilidade para encontrar a resposta a qualquer questão e as habilidades necessárias para determinar se a resposta é correta ou não.
O reconhecimento de características da rede, desde a força dos laços fracos e a natureza de mundo-pequeno das redes ao poder dos coletivos e como e por que mudar as configurações de privacidade do Facebook, poderia ser o próximo letramento ensinado, depois da detecção de lixo. As redes não são mágicas, e saber os princípios pelas quais elas operam confere poder ao conhecimento. Como as pessoas poderiam NÃO usar a internet de modo confuso, atrapalhado e fragmentado se ninguém as instrui como utilizar a net de maneira saudável? É inevitável que as pessoas usem a net de maneira que ela influencie como elas pensam e o que pensam.
Não é inevitável que essas influências sejam destrutivas. A saúde da comunidade online irá depender de que mais do que uma pequena minoria de usuários da internet se tornem internautas letrados.
Fonte: http://blog.midiaseducacao.com/2013/04/howard-rheingold-atencao-e-o-letramento.html
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